No Bairro do Aleixo

sexta-feira, julho 30, 2004

Um desafio

O que é que fazem cinco habitantes do Aleixo no Champanhe Club em Matosinhos?
  1. Vendem droga;
  2. Compram droga;
  3. Acompanham as namoradas;
  4. Chulam as namoradas;
  5. Vêem ‘gajas boas’ do leste europeu a dançar;
  6. Vêem ‘gajas boas’ do leste europeu a tirar a roupa;
  7. Estudam a possibilidade de abrir uma delegação no Bairro.

terça-feira, julho 27, 2004

Joquinha das Claquetes.

Mudou-se para o Aleixo há poucos meses. Era um jovem de boas famílias, com um futuro promissor. Até tirou um curso superior. Queria ter entrado numa escola de cinema mas não conseguiu. Tentou um curso de literaturas mas depois percebeu que a sua verdadeira vocação era ensinar português a adolescentes. Queria mudar o mundo, sair ‘da porcaria deste país’, ser uma pessoa diferente. Era um apaixonado: por literatura (do Júlio Dantas à Laurinda Alves), por cinema (citava os clássicos, os que viu e os que não viu), por música (só comprava roupa depois de devidamente testada em video-clips de bandas inglesas) e, secreta e inexplicavelmente, por insectos. Era um rapaz com estilo: caminhava com estilo, falava com estilo, olhava com estilo. A sua carreira de professor teve um bom início, mas entrou em declínio por ter assediado alunas do 5º ano. Foi discretamente expulso de uma escola C+S. Descobriu as drogas. Nunca mais quis descobrir outras coisas.
Ainda é um romântico e já aconteceu sentar-se com o Pedro a uma mesa de café e trocarem alguns elogios. Dão-se bem e até já partilham alguns riscos.
Não é um drogado convicto. Não se injecta porque tem medo de agulhas, o que lhe dá uma espécie de vantagem em relação aos amigos do Bairro. Orgulha-se de estar quase limpo, de não ser um viciado, de se conseguir controlar e de ter vários empregos. Faz biscates como copydesk em ‘editoras alternativas e marginais’, faz revisão de provas para o jornal Família Cristã e para o jornal DICA, a newsletter de uma cadeia de supermercados. Às vezes diz que é escritor, outras assume-se como jornalista, também já afirmou estar com ‘umas cenas sobre cinema, eu e uns tipos que conheço, vai ser demais.’
O seu entusiasmo pelo cinema já o levou a trabalhar na bilheteira de um multiplex. Falava apaixonadamente com o público, nunca deixava de dar a sua opinião sobre um filme. Foi despedido depois de ter convencido cinco pessoas a não comprarem bilhete porque o filme não era bom, ‘muito convencional, demasiado hollywoodesco!’
Ninguém sabe muito bem de onde lhe vem o nome, diz-se que quando chegou ao Bairro mostrava orgulhosamente uma colecção de claquetes em miniatura, algumas eram réplicas das usadas em filmagens históricas, tinha até uma assinada pelo Antonioni que nunca mostrava a ninguém ‘só quem conhece os filmes é que pode ver isto’. Depois vendeu tudo por cinco contos num dia menos bom.
Quando o encontro está quase sempre sentado no café, um cimbalino meio vazio na mesa, o jornal aberto, um caderninho sujo para tirar notas ou assentar pensamentos e um ar pensativo a penetrar o infinito! ‘É um poeta’, sussurra a rapariga do café com quem mantém uma relação clandestina, porque o pai dela não podem saber. Ela não é do Aleixo.

sexta-feira, julho 23, 2004

Pedro.

‘Lá porque uma rosa cheira melhor que uma couve, não significa que faça uma melhor sopa!’ ouvi-o dizer a uma rapariga sentada ao seu lado enquanto preparava o chuto! Estava cansado e falava baixo, quase sem mexer os lábios. Continuou: ‘aquele gajo queria vender-me um ramo de rosas, mas eu disse-lhe que queria era fazer a porra duma sopa. Não queria aquela cena!’ Acabou de aquecer a colher. ‘Não era má, mas esta aqui, já vais sentir, faz uma sopa do carago. É como as couves.’ Abriu a seringa. ‘Gosto de citações!’ Eu não gosto de citações, mas ele é um verdadeiro romântico. Apertou o garrote à rapariga e espetou-lhe a agulha no braço. Ela sorriu.

terça-feira, julho 20, 2004

A frustração de Pedro

Pedro confessou-me que até o terem encarregue de fazer aquela investigação, nunca tinha pensado nem em redes de promoção nem sequer na internacionalização do Bairro. Possivelmente mais nenhum dos moradores se voltou a lembrar dessa ideia, mas aquele primeiro material encontrado incentivou-o a procurar mais informações.
Num rasgo mais ambicioso Pedro decidiu visitar alguns bairros da cidade, falar com as outras comissões de moradores e vender a ideia de ‘parcerias internacionais para promover a qualidade dos produtos vendidos’. Falou com gente do Viso, falou com gente de Francos, falou com gente do Cerco, falou com gente de Campanha e do Lagarteiro.
Sentiu-se um bocadinho Fernão Magalhães contemporâneo e toxicodependente a tentar vender aos reis ibéricos o caminho da salvação e a solução para ‘acabar com o sofrimento humano através da química’.
Ninguém lhe prestou atenção!
Os seus esforços não tiveram nenhum resultado. ‘Um rotundo falhanço’, desabafou ele quando se sentou na mesa do café onde eu bebia um fino. Foi comprar mais um chuto e dormiu o resto do dia.
Acordou cheio de energia e pensou: ‘Tenho o filha da puta dum computador com net em casa. Vivo aqui há uma porrada de anos. Vou escrever sobre isto. Tento arranjar alguém para pôr em inglês e vou ver no que é que dá.’ Levantou-se com um belo sorriso e tomou o pequeno-almoço na cozinha. ‘Foda-se! Isto pode ser uma grande ideia!’ disse ele à namorada enquanto lhe dava um apalpão no rabo.
Começou a escrever um blog.

sexta-feira, julho 16, 2004

Octávio.

Tem sotaque brasileiro, o cabelo em forma de cogumelo, castanho. Os olhos pequenos e uma cara muito marcada pelas bexigas. Pede desculpa em voz alta e mostra-se simpático com as pessoas. Não apareceu há muito tempo no Bairro, mas conhece quase toda a gente. Tem dormido nuns caixotes velhos, junto à loja dos trezentos. Ontem encontrei-o junto a uma máquina de tabaco, no café. Estava com problemas com os trocos e pedi-lhe cinquenta cêntimos. O problema dele é o cheiro.

quarta-feira, julho 14, 2004

Filipe III.

Encontrei-o novamente e no mesmo estado em que o vi pela primeira vez, mas com barba grande. Discutia com dois tipos a quem ‘arranjou uma boa cena’. Queria cobrar uma pequena comissão que lhe foi recusada. Correu atrás do carro, pediu ajuda a um amigo, abriram as portas do carro e ameaçaram. Ele só queria umas ‘moedas para a ressaca ou umas migalhas’. ‘Eu arranjei-te uma boa cena, dá lá umas moedas’. O amigo ameaçava. O amigo tinha calças de pijama vestidas, conduzia uma bicicleta de criança e tinha um bigodito cómico e sujo. E ameaçava. O Filipe voltava a precisar de moedas para a ‘quarteira’. Sempre a mesma ‘quarteira’.

sábado, julho 10, 2004

Xavier.

É uma personagem conhecida da Baixa. Há uns anos encontrava-o à porta do Rivoli com a mãe doente. Dormiam os dois na rua Passos Manuel. Cabelo comprido, sujo, sempre com um cobertor, ora branco ora cinzento, aos ombros. Apoia-se numa muleta. Vejo-o mais vezes no Bairro ultimamente. A mãe morreu há alguns meses. Anda sozinho com um cão rafeiro e mal cheiroso. Continua a pedir dinheiro para os medicamentos da mãe. Quando tenho a janela aberta reconheço o barulho da muleta sozinha a bater no passeio, lá em baixo.

quinta-feira, julho 08, 2004

Joaquim.

É dos mais velhos. Tem uma barba branca, muito longa. Não sei onde passa os dias, vem ao Bairro todas as noites por volta das oito e meia e depois desce até às bombas da BP, onde passa o resto da noite. Pede ‘uma moedinha senhor doutor’ a todos os clientes. É simpático. Há alguns dias passou por mim na rua, ia com outro tipo, quase a correr. Pararam junto ao muro e ele pegou numa garrafa escondida num buraco, inspeccionou-a e atirou-a para o chão, desapontado. ‘Já encontrei ali umas cenas uma vez.’

quarta-feira, julho 07, 2004

As festas no Bairro

A localização do Bairro, como é sabido, é bastante privilegiada. A meio caminho entre a foz e a baixa da cidade, é uma zona de fácil acesso e relativamente calma onde se pode estacionar o carro e andar a pé ou de bicicleta. Tudo isto faz com que o Aleixo seja um dos melhores locais da cidade para se fazerem festas, públicas ou privadas.
Em relação a festas públicas, não vou dizer muitas coisas, há três barcos ao fundo da Rua do Aleixo que são bastante conhecidos e que promovem festas muito concorridas.
As festas privadas podem ser abordadas de diversas formas.
Em primeiro lugar, e porque não há mais nada a dizer, temos as festas familiares. É habitual, pelo menos ao fim de semana, encontrarmos recatadas famílias em pequenos pátios, terraços, quintais e jardins, em saudável convívio. Sardinhas, quando é tempo disso, fêveras ou outras carnes durante o resto do ano e sempre que a chuva não impeça.
Em segundo lugar temos as festas do pijama, sobre as quais eu nada sei porque nunca participei.
Por último temos as festas com nomes estranhos. Quase sempre nomes aleatórios, inventados horas antes do acontecimento para não causar suspeita. Não posso, nem devo, referir nenhum nome para manter a discrição.
São festas que acontecem em algumas casas do Bairro. As pessoas que frequentam estas festas variam de acordo com o tema da festa, com a altura do ano, com a ementa e, claro, com o anfitrião. Normalmente são reservadas a 10 ou 15 pessoas, das quais pelo menos metade já se conhece.
Começam quase todas com um jantar volante, durante o qual se bebe bom vinho. Os convidados escolhem a música durante e depois do jantar. Escuta-se. O jantar tem várias entradas, pratos frios, saladas. Vinho tinto. A sobremesa, a um canto da sala, é quase sempre deixada para mais tarde ou mesmo para o dia seguinte. A partir desta altura é quase tudo pura ficção até as pessoas estarem cansadas e irem embora, ou ficarem a dormir se houver um espacinho no chão.
Na última destas festas, onde eu tive oportunidade de participar, ocorreram alguns factos estranhos.
Para além de mim, estavam presentes mais oito pessoas. Algumas, sentadas à mesa comiam salmão fumado, mexilhões, tostas com queijo. Bebia-se vinho. As outras pessoas conversavam dispersas na sala ou na cozinha. Bebia-se um vinho tinto muito bom. Não me recordo qual. Havia também cerveja na mesa e circulavam algumas drogas num espelho, numa pequena caixa verde, num cigarro. A sobremesa, como sempre, foi ignorada. Era gelado de chocolate belga ou salada de frutas. A música aumentou de volume, afastou-se a mesa e algumas pessoas começaram a dançar. Continuaram a circular diferentes drogas. Acabou e vinho e abriram-se garrafas de vodka whisky e martini. Enquanto algumas pessoas dançavam as outras conversavam conforme podiam. Estava muito calor.
A sala e a cozinha desta casa, as áreas mais frequentadas durante a festa, estão voltadas para um quintal de uma igreja. Durante toda essa noite duas pessoas trabalharam no quintal. A plantar batata ou nabos. Algumas vezes durante a noite fomos à janela observar. Oferecemos uma garrafa de vinho aos trabalhadores nocturnos. Sorriram com resignação. Algumas horas depois estavam já cinco pessoas no quintal com enxadas a cavar a terra. Trabalhavam em silêncio, metodicamente, como se aquilo fosse o que sempre tinham feito: trabalhar na terra de madrugada.
Por volta das quatro da manhã, e aqui começam os factos verdadeiramente estranhos presenciados por toda a gente, entra no quintal e mistura-se com os trabalhadores um senhor de batina muito escura e brilhante. O padre da igreja. Alguém fez uma sonora piada com a batina e com o padre. Ele vinha sem enchada para cavar a terra. Falou aos três homens e às duas mulheres que lá estavam. Escutaram e pousaram as enchadas. Pararam de trabalhar. Olharam com alegria para o padre durante alguns segundos e depois, como se tivessem em grande euforia, começaram a correr uns atrás dos outros. Correram por todo o quintal. Tentavam ter alguma organização na corrida, como se de uma caçada se tratasse. O padre sorria e de vez em quando fazia de um comentário um grito. Um dos homens mais velhos foi o primeiro a parar. Estava visivelmente cansado e tirou o casaco. Ficou só com uma camisola interior de alças, daquelas com buraquinhos. Aos poucos foram todos parando para respirar melhor. Bebiam de umas garrafas de vidro escuro e preparavam-se para se irem embora. Enquanto caminhavam em direcção à casa, com a respiração ofegante iam deixando para trás os casacos, os chapéus, uma bota, as calças. Quando desapareceram dentro de casa estavam todos quase nus e transpirados.
O padre ficou no meio do quintal. Admirava tudo com um ar de clérigo satisfeito depois da ceia. Regozijava-se pela alegria do seu rebanho.
Parámos a nossa tímida festa para observar aquele acontecimento.
Dentro da casa a luzes acenderam e começamos a ouvir canções. Canções de cada vez mais sonoras, acompanhadas de gritos e danças.
Batemos palmas e gritámos tão alto quanto possível e alguém tentou perguntar se nos podíamos juntar à festa. Ninguém nos ouviu. Continuaram a cantar e a dançar.
Sempre que falamos disto ficámos muito confusos. Todos testemunhamos este estranho e divertido episódio, no entanto ninguém estava suficientemente lúcido para garantir e descrever pormenores sobre o assunto. O que acabei de contar não é mais do que uma tentativa de reconstituição do que todos nos lembramos de ter visto e das peças que foi possível juntar depois do acontecimento. Um caso para um bom detective.
Obviamente que este acontecimento não é nada de extraordinário e talvez não tenha sequer relevância para ser relatado com esta pompa. É apenas um pequeno caso de paróquia.
Por uma questão de autodisciplina, os posts não se devem prolongar demasiado. Por isso não vou conseguir explorar, por agora, outras festas do Bairro à porta fechada.

sábado, julho 03, 2004

Uma rede internacional

Alguém teve a ideia de incluir o Bairro do Aleixo nos roteiros internacionais de promoção do consumo de estupefacientes. A sugestão foi acolhida com grande entusiasmo mas depressa dividiu a população em várias facções: aqueles que apoiam incondicionalmente a ideia; aqueles que apoiam mas só se isso não implicar iniciativas pró-legalização, ‘precisamos do lucro, precisamos do lucro!’; aqueles que apoiam mas só se for no sentido da luta pela legalização, ‘os filhos da puta só pensam em dinheiro’; aqueles que recusam completamente qualquer envolvimento do Bairro nesses assuntos e, por fim, aqueles que não sabem porque não têm conhecimentos para decidir o que quer que seja, ‘eu não sei que vantagens isso traz. Eles vão arranjar o elevador?’
Foi necessário reunir mais uma vez a Comissão de Moradores, Traficantes, Consumidores e Outros Negociantes do Bairro do Aleixo (CMTCONBA) para discutir a proposta e decidir sobre este assunto. Como ninguém sabia muito bem como concretizar a ideia, nem como abordar uma associação internacional, nem sequer se existe de facto alguma associação ou rede que promova o consumo de estupefacientes, encarregaram um jovem elemento da Comissão com conhecimentos de inglês e computador em casa, de fazer uma pesquisa e recolher informações para serem apresentadas e discutidas na próxima reunião.
E aqui chegamos a um ponto interessante deste acontecimento.
O entusiasmo do jovem escolhido, Pedro, foi de tal ordem que, passados dois dias, regressou à Comissão com centenas de páginas de informação impressa sobre organizações que operam através do espaço virtual. Ou seja, organizações sem sede física e sem despesas fixas, cuja manutenção é garantida por indivíduos que trabalham sem fins lucrativos e se interessam por estas matérias.
Os elementos da Comissão ficaram confusos com a quantidade de material coligido pelo Pedro e mostraram-se insatisfeitos pelos resultados não serem nada concretos sobre a existência de organizações internacionais que reúnam parceiros idênticos ao Aleixo, nem sobre a possibilidade do Aleixo se associar a eles. Ou seja, a informação reunida dizia apenas respeito a investigações mais ou menos científicas, mais ou menos honestas, sobre psico-fármacos e outras substâncias químicas associadas. Vou tentar resumir os dados apresentados pelo Pedro.
A primeira organização relevante encontrada foi uma tal de BLTC, que, explicou ele, são as iniciais para a expressão inglesa Better Living Through Chemistry. Esta organização desenvolve um programa de investigação em diversos campos da ciência. Alguns deles, segundo o Pedro, não interessam absolutamente nada para o Aleixo porque têm a ver com ‘manias de mudar o universo e eliminar o sofrimento humano através de redefinição da espécie humana e da criação de universos alternativos desenvolvidos pela ciência e pela tecnologia. Estão mais ou menos a ver?’ Outros campos de acção, e onde são disponibilizadas inúmeras informações úteis para o Bairro, estão directamente relacionados com investigações sobre estupefacientes naturais e químicos que, segundo Pedro, ‘são outro caminho para eliminar o sofrimento humano. Eles explicam tudo.’
Por exemplo, em http://cannabis.net podemos encontrar extensa informação sobre as vantagens e desvantagens do uso de cannabis, de marijuana e derivados, para fins medicinais e de lazer. Em http://mescaline.com encontramos dados sobre o uso e produção de mescalina. Em http://cocaine.org e em http://www.heroin.org descreve-se tudo o que é preciso saber sobre opiáceos e sobre as drogas produzidas pela folha de coca sul-americana, incluindo dados importantes sobre a evolução das redes de tráfico. Entre outros sítios referenciados e que disponibilizam informação sobre praticamente todas as drogas – legais e ilegais, na moda e fora de moda, inventadas e por inventar – destaco apenas mais um, que foi particularmente enfatizado pelo Pedro. O sítio http://www.mdma.net leva-nos ao universo das drogas sintéticas e psicadélicas, com informações detalhadas sobre os seus inventores e sobre as sucessivas experiências que suscitaram ao longo dos anos.
Qualquer destes sítios contém, para além de dados relevantes sobre os processos de produção e de tráfico, informações históricas e recomendações para usos medicinais e de lazer, diversos artigos científicos sobre todos estes assuntos. Um manancial de informação muito útil para curiosos, consumidores e negociantes.
Foi neste ponto que a plateia se transformou quase num campo de batalha: estava o Pedro a citar, como exemplo, um artigo sobre o consumo de haxixe, quando se ouviu uma cadeira a ser arrastada e um morador de voz exaltada: ‘que incentivem o consumo acho bem, agora que me venham com tretas sobre vender droga nas farmácias e sobre consumos moderados é que não me parece nada bem. Cá para mim esses gajos não são do negócio.’ A discussão começou.
Com é fácil de perceber, o morador que iniciou a discussão tem uma forte participação nos mercados da cidade e opõe-se violentamente a qualquer informação que ponha em causa a sua legitimidade para fornecer o melhor produto.
Entretanto levantaram-se outros moradores que se manifestaram contra o facto de se falar demasiado abertamente e com termos esquisitos sobre estupefacientes. ‘Para que é que nos interessa isso? O Bairro sempre cresceu e nunca ninguém falou muito do assunto. O importante é o resultado. As explicações e os desenhos não interessam.’
‘Se queremos um Bairro moderno e competitivo, temos que estar informados e procurar os melhores produtores. Temos que investir nos meios tecnológicos adequados e apostar na qualidade. Toda a gente sabe isso.’ Gritou alguém numa tentativa de defender o Pedro. Houve quem lhe chamasse ‘novato com a mania das grandezas’.
Tentei ficar mais tempo para recolher mais reacções mas não consegui. Toda a Comissão estava já levantada, as portas da sala abertas com muitas cabeças a espreitar. Saí discretamente depois de combinar um encontro com o Pedro para trocarmos mais informações. Ele ainda só tinha exposto uma pequena parte das suas pesquisas.
A ideia de adesão a uma associação internacional ficou por aqui, não que tenha sido completamente esquecida, mas ninguém voltou a falar dela e esperam-se melhores tempos para retomar a iniciativa. O Pedro continua com as investigações.