Rui.
Também não tem uma perna. De barba escura, muito dura, olhar agressivo e a cara marcada por feridas violentas. Passa os dias no cruzamento perto da Faculdade de Letras. Vai de bicicleta do Bairro até lá. Pedala com a perna esquerda, na mão direita equilibra as muletas e sobe, sobe, sobe. Quando algum autocarro o ultrapassa ele vê o equilíbrio comprometido. Insulta o motorista. Continua a pedalar. Estaciona a bicicleta no triângulo que divide quem segue em frente e quem vira à direita. Espera pelo sinal vermelho e percorre todos os carros com a mão estendida. Alguns condutores fecham o vidro para não terem que lhe sentir a respiração e a voz pesada a dizer ‘uma moeda por favor’. Aos outros tenta explicar que está doente da perna, da única que ainda tem, que a gangrena lhe levou a outra há seis meses, que precisa de medicamentos, que precisa de ir ao médico. Às vezes só pede moedas porque ou o desânimo ou a ressaca não lhe permitem gastar tempo e palavras com mais explicações. Gosta de insultar as pessoas.
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